17 Deve-se ter sempre em mente que a medicina tem como missão, antes de qualquer coisa, reduzir o sofrimento das pessoas. Sim, a missão da medicina nunca foi, historicamente, a de reduzir este ou aquele desfecho patológico de relevância discutível. Ao começar a tratar ativamente as pessoas antes mesmo que a doença tenha se ma- nifestado ou causado qualquer problema, corre-se o risco de que o tratamento seja mais prejudicial do que a própria doença. Primum non nocere! Antes de tudo, não prejudicar ainda mais a pessoa que busca ajuda médica. Este dito de Hipócrates sempre foi o lema primeiro da boa medicina. Nunca é demais lembrá-lo. E toda vez que se começar a tratar ativamente uma pessoa com uma pré-do- ença, como um “pré-diabetes”, deveríamos tentar entender como se- ria para aquela pessoa o balanço entre a importância dos desfechos clínicos dos estudos e os contratempos impostos pelo diagnóstico e tratamento antecipados. Pode ser interessante imaginar como seria explicar para uma pes- soa leiga que se pretende antecipar o tratamento de alguém com um possível futuro diabetes para, por exemplo, reduzir a chance desta pessoa desenvolver microalbuminúria (uma “microcomplicação” renal relacionada ao diabetes) daqui a vários anos. Ela sabiamente perguntaria: “Mas quem é essa tal microalbuminúria?” E, no final das contas, a nossa condição de seres mortais nos garan- te que estamos todos pré-mortos. Mas nem por isso precisamos agir como mortos desde já. Optamos por viver alegremente da maneira que nos traga o máximo possível de prazer enquanto pudermos. Apro- veitamos o máximo da vida até que nosso fim inevitável chegue. Será que não deveríamos agir da mesma maneira em relação às doenças?

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