revista Sesc Arte e Educação

arte em espaços não formais Escute o artigo 34 35 Revista Sesc de Arte Educação A CIDADE COMO UM TERRITÓRIO DE CUIDADO, CONVIVÊNCIA E CONHECIMENTO Há um ditado africano antigo que nos convida a pensar que necessitaríamos de uma aldeia inteira para educar uma criança. Pensando nessa relação de coletividade e diversidade de saberes tão importante para a promoção de uma educação em nível integral, o projeto Criar, desenvolvido pelo Sesc em diversas cidades do Brasil, busca trazer o eixo do território enquanto um espaço formativo e colaborativo, gerador de aprendizagens (SESC, 2020). No RS, as cidades de Caxias do Sul, Erechim, Montenegro, Porto Alegre, Taquara e Tramandaí nos convidam a refletir mais sobre a importância do cuidado, da interação e da aproxima- ção com diferentes lugares e espaços da cidade, fortalecendo o sentimen- to de pertencimento e cidadania. Em contato com a natureza, as crianças agem livremente, criam brinquedos e brincadeiras diferentes dos conven- cionais, conectam-se com o meio que as cercam e socializam-se mais afeti- vamente, tendo experiências enrique- cedoras que contribuirão para o seu desenvolvimento integral. No Projeto Criar de Montenegro/RS, as crianças frequentam praças e ou- tros espaços que possibilitam o con- tato com a natureza. Percebemos o quanto a vivência nesses espaços in- centiva a criatividade e espontanei- dade, a autonomia e a socialização da forma mais natural. As crianças de- monstram se sentirem livres e à von- tade para expressar seus sentimentos e exercitar seus corpos a partir dos di- ferentes contextos. Nessa relação de exploração do território e de reconhe- cimento da cidade, criam-se vivências e aprendizagens enriquecedoras para o desenvolvimento de memórias afeti- vas (MOLL, 2012). Quando a criança se movimenta, olha, ouve, toca, cheira e experimenta as possibilidades que estão presentes na natureza, aumenta seu repertório e aprende sobre o que está a sua volta com muito mais prazer e significado. O cuidado com a terra convida as crianças a reconhecer os impactos da ação humana e da importância do acompanhamento para que as plantas, legumes e vegetais cultivados cresçam saudáveis e possam render uma ali- mentação livre de agrotóxicos e pesti- cidas. Essa experiência tem contribuí- do para a ampliação do paladar, visto que a criança se sente mais interessada em degustar daquilo que ela cultivou. Em Caxias do Sul e Ijuí, a possibilida- de de criar uma horta de chás foi co- locada em prática juntamente com as crianças; além do plantio e do cuidado, também se exercitou a responsabilida- de coletiva. O espaço foi pensado para também ser utilizado pela comuni- dade, que colaborava com a manuten- ção e distribuição de mudas de chás, além de contribuir com conhecimento e afeto. Trazer as mesas e materiais para um ambiente externo, desenhar na pra- ça ou na calçada ganham um signifi- cado diferente para as crianças que, principalmente nas grandes cidades, acabam pouco usufruindo de es- paços naturais para brincar e criar. Por isso, é importante entender que se aventurar em um novo contexto para além da sala formal possibilita às crianças o contato com diferentes elementos, texturas, temperaturas, sons e sensações. Em Erechim, uma experiência é lem- brada com carinho pela equipe pe- dagógica: “Ao chegar em uma praça, encontramos a grama e a quadra es- portiva com poças d’água. Era um dia de outono com temperaturas não mui- to elevadas que se tornou cenário pro- pício para as crianças experimentarem uma sensação diferente: tirarem os cal- çados e sentirem os pés descalços to- cando o chão úmido”. Um ato simples de tirar os sapatos e sentir o chão trou- xe para o Arthur (7 anos) um significa- do especial, pois segundo ele: “Nunca imaginei que fosse tão bom pisar na grama sem calçado. Foi minha primei- ra vez”. São falas como essa, carrega- das de afeto e significado, que incen- tivam a equipe a buscar novas formas de dialogar com a cidade e de pro- porcionar modos de (re)conhecer os espaços pela sensibilidade.

RkJQdWJsaXNoZXIy NjI4Mzk=